Foto de capa: Reprodução FAPESP
Desde que teve a ideia de iniciar a S Cosméticos do Bem, o objetivo da farmacêutica Soraya El Khatib era desenvolver produtos baseados em preceitos da economia circular, em que toda a cadeia de produção contribui para que o meio ambiente seja o menos explorado possível. A meta, depois de anos de pesquisa, começa a ser atingida.
Nos últimos meses, a startup, que é uma spin-off da Universidade Estadual de Campinas e teve apoio do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), tem registrado boa aceitação de um dos seus produtos inovadores disponíveis de forma comercial: um sérum rejuvenescedor.
Os bioativos usados no cosmético desenvolvido pela startup de Campinas são extraídos de uma planta originária da China, a artemísia (Artemisia annua). Um dos principais componentes dessa espécie é usado na Ásia, pela medicina tradicional chinesa, para o tratamento da malária.
“Segundo vários estudos, essa planta tem, aproximadamente, três mil bioativos. O produto que desenvolvemos a partir dela tem uma formulação mais viscosa que um líquido, mas não chega a ser um creme, e tem se mostrado um sucesso em termos de regeneração da pele, o que reduz de forma significativa os sinais de envelhecimento” diz El Khatib ao Pesquisa para Inovação.
Os estudos sobre a artemísia mostram que os compostos da planta são potentes e eficazes no combate tanto da malária cerebral como da malária falciparum. Essa variedade da doença – causada pelo plasmodium transmitido na maioria das vezes por mosquitos do gênero Anopheles – é considerada uma das mais agressivas para o ser humano. Foi por causa dos estudos das propriedades da artemísia no combate à malária que a pesquisadora chinesa Yu Yu Tu ganhou parte do Nobel de Medicina e Fisiologia de 2015.
Nos laboratórios da startup, contudo, o principal objetivo dos pesquisadores era desenvolver produtos cosméticos e repelentes para insetos comuns no Brasil a partir da planta. Para isso, desenvolveram técnicas inovadoras para extração dos princípios ativos que não poluíssem o meio ambiente.
“As metodologias convencionais se mostraram um desastre total em relação aos nossos objetivos. Os resíduos desses processos são muitas vezes tóxicos e poluem muito o ambiente, além de não serem escaláveis. A nossa condição de montar toda a cadeia de acordo com as práticas da economia circular nunca seria atingida daquela forma”, explica El Khatib.
O vegetal chinês é aromático, perene e cresce em arbustos. Com folhas verdes e um caule ereto e acastanhado, chega a atingir um metro de altura. No Brasil, inclusive, o cultivo da planta já sofreu as devidas adaptações por causa das diferenças climáticas entre a América do Sul e a China, o que também favoreceu a utilização dela no país. Os componentes não voláteis da planta usados pela medicina tradicional chinesa, principalmente a artemisinina, se mostraram muito úteis para os objetivos dos pesquisadores da S Cosméticos do Bem.
Os componentes das fórmulas da família desenvolvidas pela empresa de cosméticos paulista são obtidos a partir de técnicas sustentáveis, que aproveitam todas as qualidades da planta, sem utilizar solventes orgânicos tóxicos.
“Esse processo garante a ausência de ingredientes alergênicos, transgênicos ou qualquer resíduo de origem animal”, afirma El Khatib.
A empresa acabou de patentear a inovação, burilada a partir dos conceitos e metodologias da química e da farmacologia.
As metas para os próximos anos são ainda mais ousadas. Além de buscar grupos parceiros para conseguir atingir uma escala maior de produção para os produtos que já estão no mercado, a linha exclusivamente voltada para os repelentes também vai continuar merecendo atenção. Nesse campo, a empresa já tem a patente de uma linha de sprays repelentes, feitos com óleos voláteis da artemísia, que prometem garantir proteção contra mosquitos, inclusive contra o Aedes aegypti, transmissor da dengue, chikungunya, do zika vírus e da febre amarela.
“Também estamos com um projeto em desenvolvimento muito promissor de um produto contra o Sars-CoV-2”, afirma El Khatib.